"Desta janela encoberta de neblina
Avisto seus brilhos solares atravessando a rua
Escondendo das lentes ofuscantes do sucesso
Seus passos decididos partiam em rotas inexistentes
Por um segundo, senti o bater ritmado do seu coração parar.
Como se o mundo parasse, se o ar faltasse.
Instantaneamente o universo retrocedeu duas décadas de evolução
Depois acelerou tão ferozmente que estrelas colidiram
Escuridão silenciosa fez em seu breve penar
Deste labirinto tortuoso que descrevo meus dias de exílio.
Observo, assustado, o correr natural de seus dias simples.
Como a um terremoto seus passos chocam com astros distraídos.
Destruindo o pouco de paz existente nos cosmos
Volte!
Por um breve instante, minha vida misturou-se com a sua.
Meus tristes relatos, observados com minhas vistas cansadas de esperar
a paz roubada, no instante que colidiu sua rota em meus dias cinzas
Os deuses festejaram a descoberta de uma constelação.
Deste quadro abstrato que minhas retinas incansavelmente entorpecem
Procuro vestígios palpáveis para reencontrar seus braços
Eu, vagando entre o real e o imaginário, suspiro a cada sonho.
Contrabandeando sorrisos puros a cristalizar nostalgicamente a vida
Desta caverna sombria a qual observo tudo contra a luz
Vejo-te flutuar pelo salão principal, deslumbrante e bela.
Ignorando as luzes ofuscantes, vejo apenas seus olhos brilhando,
no escuro opaco, reluzente luas prateadas em noites de euforia
Seu sorriso derretia satélites e corações gelados."
Caio Fernando Abreu