terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Frases soltas...



Caio Fernando de Abreu

domingo, 27 de dezembro de 2009

Mulher de 30 ...


 Cibele Santos

sábado, 26 de dezembro de 2009




"Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente!"

Vinícius de Moraes

Crise de Abstinência

"Não sei se existe sentimento mais doloroso e auto-punitivo do que, conscientemente, se abrir mão da pessoa amada para preservar a sua própria sanidade. É quase um contra-senso: arriscar perder a sanidade para preservá-la. Dói de um jeito que é difícil de descrever. A sensação de que se está nadando contra a corrente da vida, que se está promovendo um movimento anti-natural na existência humana, é próximo de uma espécie de auto-mutilação. É uma dor física que oprime o peito e queima o coração (literalmente é esta sensação) a cada lembrança dela. Fico às vezes tentando comparar com outros tipos de perda: a pessoa morrer ou simplesmente te trocar por outro ou você descobrir por alguma razão que seu amor não era na verdade grande coisa, enfim, fico tentando achar algum tipo de conforto em minha posição atual. Mas não consigo. Confesso que não. Ela, ao ler esse texto, dirá com certeza que é bem-feito pra mim, que eu mereço esse sofrimento e que eu pedi por ele. Paciência. Fiz tudo o que estava ao meu alcance. Não quer dizer que foi muita coisa, mas foi o máximo que consegui. Acho que ela tentou também. E, como eu, encontrou limitações pessoais que a impediram de enxergar além dos meus defeitos, dos meus deslizes. Sei que ela me ama como eu a amo mas sei também que ela como eu escolheu abrir mão para tentar me esquecer. Tudo isso torna nossa decisão um pouco mais difícil, mais insana. Tínhamos uma conexão muito forte. Experimentávamos o sentimento do outro, mesmo à distância. E parece que ainda acontece isso. Às vezes estou me sentindo muito tranquilo e sereno e de repente me dá uma angústia avassaladora, não sei vinda de onde. Me dá uma vontade quase que incontrolável de ligar pra ela, para saber como ela está. Ah, como eu gostaria que tudo isso não passasse de um sonho, de um pesadelo. Não sei o que é pior: não ter amado nunca ou amar loucamente, ter a certeza de que encontrou a pessoa da sua vida e no instante seguinte descobrir que este amor está fazendo mais mal do que bem, para os dois. E olha que a gente tentou. Ficamos mais tempo tentando nos entender do que vivendo efetivamente o amor. Perplexos com nosso fracasso, não realizamos como é que aquele sentimento arrebatador e transformador não teve a decência de suportar as primeiras e idiotas crises? Por que é que não conseguimos nos dar uma segunda chance? Sinto esta relação como se fosse uma droga pesada. No começo era só alegria. Depois começou a ressaca e mesmo com ela não quis abandonar o seu barato. Eu precisava sempre de uma dose a mais, mesmo sabendo que no dia seguinte viria o bode. E eu não conseguia largar, de jeito nenhum. Chegou um momento em que a droga quase nem barato dava mais. E eu não conseguia largar. E agora que larguei, estou em crise de abstinência. Dói o corpo, dói a cabeça, dói a alma. E eu já ouço de novo “bem-feito, se ferrou, agora azar o seu”. Tudo bem, eu vou superar isso também. Ela é uma pessoa extraordinária, só que não conseguimos encontrar um canal de comunicação saudável e positivo. Eu falava A e ela entendia B, e vice-versa. E isso também doía bastante. O fato de eu não ter nada contra ela também dificulta ainda mais a situação. Se eu pudesse sentir raiva, pelo menos, eu poderia usar isso como forma de auxiliar no processo de esquecimento. Mas eu não tenho nada que a desabone. Ela não é perfeita, não é exatamente uma pessoa simples e permeável, mas nada do que ela me fez ou disse de desagradável ficou marcado em minha memória. Não guardo mágoas. Só sinto que eu estava definhando, perdendo a minha sanidade, que já não é grande coisa. Nossa, como eu queria ter alguma razão lógica para esquecer essa mulher de uma vez! Meus sentimentos por ela foram quase que patológicos. Fui obssessivo, confesso. É, talvez ela tenha razão. Talvez eu tenha mesmo estragado tudo com minhas manias, meu egoismo e minha falta de flexibilidade. Talvez. Mas se o amor fosse forte o suficiente, isso não seria exatamente um impeditivo. Não sou canalha, pelo menos penso que não. Acho que mereço que a pessoa que me ame confie em mim o suficiente quando digo que estou me esforçando para mudar. Mas também se aquilo que sou hoje não é satisfatório para ela, eu realmente não posso fazer nada. Acho que se você precisa que a outra pessoa mude para que você possa amá-la, então algo está fora de lugar. Não me arrependo de nada do que fiz, já que quando fiz era o que eu achava que deveria fazer. E gostaria o quanto antes de transformar este amor pela mulher, por um amor pela pessoa. Mesmo que a gente nunca mais se veja. Na verdade, é isso que ela queria, faz tempo. Ela desistiu de mim como homem bem antes de eu desistir dela como mulher. Ela queria que fôssemos amigos. Acho até que seria possível, mas não de uma hora para a outra. Passar de amor da vida para amigo num estalar de dedos não me parece razoável. Quem sabe um dia a gente consiga. Eu sei que enchi muito o saco dela com esta história, cobrei mesmo que a gente voltasse, mas ela jamais abriu a guarda. Mesmo assumindo nas entrelinhas que ainda me amava, não conseguia superar as barreiras que de alguma forma provoquei nela. Ou provocamos os dois, sei lá. Paciência. Se não era para ser, não era para ser. Mas mesmo assim, acredito que o sentimento não irá morrer. Só irá mudar de forma. Onde quer que ela esteja, vou sempre torcer por ela, sempre desejar que seja muito feliz, pois ela merece. E se acreditasse em deus, também rezaria por ela. Pensando bem, por ela eu até aceito a possibilidade de acreditar na efetividade de uma boa e devotada oração. E que a nossa dor se dilua o mais rápido possível e nos permita seguir em frente em nossas vidas com o coração aberto para outros amores; tranquilos, equilibrados e harmônicos. Amém."


Henrique Szklo

Frases soltas...




Caio Fernando de Abreu

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Mulher de 30 ...



Cibele Santos

O espírito da coisa

"VOCÊ SEMPRE PEGA O ESPÍRITO DA coisa? Geralmente o espírito da coisa é algo que fica subentendido, só as almas atentas conseguem captá-lo. A verdade é que, em um mundo cada vez mais pragmático, é difícil pegar o espírito da coisa, seja que coisa for esta.

O que dizer então do espírito do Natal? Antes ele entrava no ar assim que dezembro iniciava. O espírito deste mês, para quem foi criança em outros tempos, era de pura magia. O Natal, que demorava tanto para chegar, estava batendo à porta. “Quantos dias faltam, mãe?” “Agora falta pouco, querida.” “Quanto?” “Uns 20 dias.” “Tudo isso?!!”
Mas a gente sabia que era pouco se comparado à longa espera de um ano inteiro. Em maio, junho, julho, o Natal ainda estava a perder de vista. Natal era o arremate do calendário, era a compensação por tanto estudo e provas na escola, era o prêmio por termos nos comportado bem, era a hora de colocar uma roupa bonita e ter algum desejo atendido, era hora de comer umas delícias diferentes, de rezar, de acreditar em todos os sonhos. O céu ficava mais azul, as estrelas se multiplicavam e nunca, nunca chovia em dezembro. Então finalmente chegava o dia 24. A empregada era liberada logo depois do almoço, o pai voltava mais cedo pra casa e nenhum moleque reclamava de ir pro chuveiro, até gostava. Já de banho tomado, era hora de esperá-lo. Ele. O verdadeiro deus de toda criança, Papai Noel.

Hoje mal entra dezembro — e com ele, trovoadas — e os shoppings lotam, o trânsito entope, os filhos pedem coisas caríssimas e ganham antes mesmo da noite feliz. Comprar, comprar, comprar. Você, meio sem grana, faz o que pode. Os outros, meio sem nada, você faz que não vê. Mas eles estão entre nós: crianças pedindo um lápis de presente, pedindo colchão de presente, sonhando com o primeiro iogurte de suas vidas. E a gente voando de um lado para o outro, sem tempo pra eles.
Isso tudo foi até ontem, quando dezembro acabou. Ao menos este dezembro insensato, ansioso, consumista, ateu, que dura 24 dias febris, onde todos correm, todos estão atrasados, todos têm compromissos inadiáveis. Uma amiga me escreveu no auge do estresse: “Pensar que o próximo será só daqui a um ano é a melhor parte da história”.
Antes de começar a contagem regressiva para o próximo, temos hoje. Temos este hiato, o dia 25. Um feriado, um domingo, uma trégua. As lojas estão todas, todinhas, fechadas. Sobrou alguma coisa da ceia para beliscar na geladeira. Você vai sentir sede de suco natural, de água gelada. Vai colocar música pra tocar, vai vestir uma camiseta limpa. Você não tem nada pra fazer, nenhum motivo pra tirar o carro da garagem, nenhuma razão para procurar vaga para estacionar. Hoje você vai andar a pé, no máximo de bicicleta. Vai falar mais pausadamente. Não vai ligar a TV, prometa. Nem sei por que abriu o jornal. Hoje é dia de caminhar devagar, de chinelo ou pés descalços. Dia de olhar bem fundo nos olhos do porteiro que está trabalhando, do motorista de ônibus que está trabalhando, e desejar a eles um feliz Natal pra valer. Com sentimento. Um sentimento que não seja medo nem angústia.

Paz.


É hoje o dia que nos restou pra isso. Um dia para sairmos de casa apenas para ir até alguém que nada possui e ofertar um pedaço de bolo, uma barra de chocolate, um travesseiro, um sabonete, uma bola, qualquer coisa que signifique uma verdadeira extravagância diante de tanta miséria. Terminou a histeria coletiva, terminou a festa, terminou a semana. É hoje, antes que tudo reinicie, que você poderá encontrar o verdadeiro espírito da coisa. Não deixe que ele escape. "


Martha Medeiros, dezembro de 2005

Mamãe Noel

"Sabe por que Papai Noel não existe? Porque é homem. Dá para acreditar que um homem vai se preocupar em escolher o presente de cada pessoa da família, ele que nem compra as próprias meias? Que vai carregar nas costas um saco pesadíssimo, ele que reclama até para colocar o lixo no corredor? Que toparia usar vermelho dos pés à cabeça, ele que só abandonou o marrom depois que conheceu o azul-marinho? Que andaria num trenó puxado por renas, sem ar-condicionado, direção hidráulica e air-bag? Que pagaria o mico de descer por uma chaminé para receber em troca o sorriso das criancinhas? Ele não faria isso nem pelo sorriso da Luana Piovani! Mamãe Noel, sim, existe.

Quem é a melhor amiga do Molocoton, quem sabe a diferença entre a Mulan e a Esmeralda, quem conhece o nome de todas as Chiquititas, quem merecia ser sócia-majoritária da Superfestas? Não é o bom velhinho.
Quem coloca guirlandas nas portas, velas perfumadas nos castiçais, arranjos e flores vermelhas pela casa? Quem monta a árvore de Natal, harmonizando bolas, anjos, fitas e luzinhas, e deixando tudo combinando com o sofá e os tapetes? E quem desmonta essa parafernália toda no dia 6 de janeiro?
Papai Noel ainda está de ressaca no Dia de Reis. Quem enche a geladeira de cerveja, coca-cola e champanhe? Quem providencia o peru, o arroz à grega, o sarrabulho, as castanhas, o musse de atum, as lentilhas, os guardanapinhos decorados, os cálices lavadinhos, a toalha bem passada e ainda lembra de deixar algum disco meloso à mão?
Quem lembra de dar uma lembrancinha para o zelador, o porteiro, o carteiro, o entregador de jornal, o cabeleireiro, a diarista? Quem compra o presente do amigo-secreto do escritório do Papai Noel? Deveria ser o próprio, tão magnânimo, mas ele não tem tempo para essas coisas. Anda muito requisitado como garoto-propaganda.
Enquanto Papai Noel distribui beijos e pirulitos, bem acomodado em seu trono no shopping, quem entra em todas as lojas, pesquisa todos os preços, carrega sacolas, confere listas, lembra da sogra, do sogro, dos cunhados, dos irmãos, entra no cheque especial, deixa o carro no sol e chega em casa sofrendo porque comprou os mesmos presentes do ano passado?
Por trás do protagonista desse megaevento chamado Natal existe alguém em quem todos deveriam acreditar mais."

Martha Medeiros, dezembro de 1998

Ninguém sai da vida inteiro


Um dia nos tiram alguma coisa e não adianta se prevenir, se precaver ou ficar atento. Isso vai acontecer. Ninguém sai da vida inteiro e os que saíram, bom, eu não os conheci. Uma noite você vai estar perdida ou tão despercebida que irão tirar sua intimidade, e acredite: você vai sentir que anda nua por toda a vida. Um dia vão lhe tirar um riso, uma oportunidade, um direito, algo que você mais gosta ou aquilo que você mais preza. Talvez você perceba na hora, talvez você só perceba muito tempo depois. Não quero parecer pessimista, mas a realidade é assim. Acredite no que te digo: o que vão tirar de você é irrecuperável.

Cah Morandi

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Separação

"Voltou-se e mirou-a como se fosse pela última vez, como quem repete um gesto imemorialmente irremediável. No íntimo, preferia não tê-lo feito; mas ao chegarà porta sentiu que nada poderia evitar a reincidência daquela cena tantas vezes contada na história do amor, que é história do mundo. Ela o olhava com um olhar intenso,onde existia uma incompreensão e um anelo, como a pedir-lhe, ao mesmo tempo, que não fosse e que não deixasse de ir, por isso que era tudo impossível entre eles.
Viu-a assim por um lapso, em sua beleza morena, real mas já se distanciando na penumbra ambiente que era para ele como a luz da memória. Quis emprestar tom natural ao olhar que lhe dava, mas em vão, pois sentia todo o seu ser evaporar-se em direção a ela. Mais tarde lembrar-se-ia não recordar nenhuma cor naquele instante de separação, apesar da lâmpada rosa que sabia estar acesa. Lembrar-se-ia haver-se dito que a ausência de cores é completa em todos os instantes de separação.
Seus olhares fulguraram por um instante um contra o outro, depois se acariciaram ternamente e, finalmente, se disseram que não havia nada a fazer. Disse-lhe adeus com doçura, virou-se e cerrou, de golpe, a porta sobre si mesmo numa tentativa de seccionar aqueles dois mundos que eram ele e ela. Mas o brusco movimento de fechar prendera-lhe entre as folhas de madeira o espesso tecido da vida, e ele ficou retido, sem se poder mover do lugar, sentindo o pranto formar-se muito longe em seu íntimo e subir em busca de espaço, como um rio que nasce.
Fechou os olhos, tentando adiantar-se à agonia do momento, mas o fato de sabê-la ali ao lado, e dele separada por imperativos categóricos de suas vidas, não lhe dava forças para desprender-se dela. Sabia que era aquela a sua amada, por quem esperara desde sempre e que por muitos anos buscara em cada mulher, na mais terrível e dolorosa busca. Sabia, também, que o primeiro passo que desse colocaria em movimento sua máquina de viver e ele teria, mesmo como um autômato, de sair, andar, fazer coisas, distanciar-se dela cada vez mais, cada vez mais. E no entanto ali estava, a poucos passos, sua forma feminina que não era nenhuma outra forma feminina, mas a dela, a mulher amada, aquela que ele abençoara com os seus beijos e agasalhara nos instantes do amor de seus corpos.
Tentou imaginá-la em sua dolorosa mudez, já envolta em seu espaço próprio, perdida em suas cogitações próprias - um ser desligado dele pelo limite existente entre todas as coisas criadas.
De súbito, sentindo que ia explodir em lágrimas, correu para a rua e pôs-se a andar sem saber para onde..."

Vinícius de Moraes

Mulher de 30 ...



Cibele Santos

Frases soltas...




Caio Fernando de Abreu

Voltas e voltas em lugar nenhum



"Desculpa, eu sei que não faz sentido te escrever agora e já faz tempo desde que esse sentido sumiu. Por minha culpa. Mas é que hoje tem tanta gente aqui e ninguém me vê... Você me viu num momento desses e é do seu olhar que eu sinto falta. Do mundo parando só pra você ser meu.



Vem me buscar, me leva pra longe daqui. No caminho de lugar nenhum eu te explico sobre minha fuga e os motivos de eu decidir voltar. Eu desisto de desistir de você. Sei que eu não posso querer você só de vez em quando, nem fazer você esperar eu me apaixonar. Só fica mais um pouco. É da sua companhia que eu preciso pra respirar agora.


Não precisa dizer nada. Seu silêncio é meu refúgio e você é minha madrugada fria de outono. Seu sorriso me aquece e nada mais faz sentido sem esses segundos que parecem horas quando estou presa nos seus olhos. Você já não pode ser o que eu quero. Porque você é mais que isso. Você é tudo o que eu queria merecer.


Desculpa, eu sei que te incomodo ligando sem parar no seu celular pra dizer nada. Mas sua voz faz a corrida maluca do meu cérebro parar. Cura minhas náuseas da angústia de não saber. E você é tão educado, tão carinhoso. Finge que não atrapalho e pergunta se pode me ligar depois - Pode sim, querido, quantas vezes quiser - Só pra eu dizer "não era nada, dá pra você vir pra cá me ver?" e você, tão sem saber como lidar com dramas femininos, diz que tenta passar depois da academia.


Eu não deixo você seguir em frente, não é? Estou sempre no seu caminho fazendo você tropeçar no passado. Esse não era o papel que eu queria, pode ter certeza. Queria fazer valer seus instantes perdidos me observando numa festa cheia e tentando entender meus enigmas. Eu sou uma decepção. Parecia tão interessante, tão cheia de luz. E agora sou essa criança que só quer agarrar você e proibir de brincar com os outros amiguinhos. Só meu, não empresto.


Não desiste de mim. Por trás de tanta indecisão tem alguém que precisa de companhia mesmo fingindo que não. Tem alguém que odeia todo mundo num segundo e chora de saudades de todos no segundo seguinte. E de você principalmente. Desculpa. Eu realmente não queria ser assim pra você. "
 
Verônica H.

Ninguém merece ser sozinho

"O seu coração sabe disso, porque certamente já experimentou o amargo sabor da solidão. É no encontro com o outro que o eu se afirma e se constrói existencialmente. O outro é o espelho onde o eu se solidifica, se preenche, se encontra e se fortalece para ser o que é. O processo contrário também é verdadeiro, pois nem sempre as pessoas se encontram a partir desta responsabilidade que deveria perpassar as relações humanas.



Você, em sua pouca idade, vive um dos momentos mais belos da vida. Você está experimentando o ponto alto dos relacionamentos humanos, porque a juventude nos possibilita ensaiar o futuro no exercício do presente. Já me explico. Tudo o que você vive hoje será muito importante e determinante para a sua forma de ser amanhã.

Neste momento da vida, você tem a possibilidade de estabelecer vínculos muito diversificados. Família, amigos, grupos de objetivos diversos, namorados e namoradas. Principalmente esses últimos, que não são poucos. Namora-se muito nos dias de hoje, porque as relações humanas estão cada vez mais instáveis e, por isso, menos duradouras. Parece que o amor eterno está em crise.


Que o seu amor não seja único!

Quando paramos para pensar um pouco, chegamos à conclusão de que o problema está justamente na forma como estabelecemos os nossos relacionamentos.

O grande problema é que geralmente investimos todas as nossas cartas naquela pessoa nova que chegou. Ela passa a centralizar a nossa vida, consumindo nosso tempo, nossos afetos, nossos pensamentos e nossas energias. Tudo passa a convergir para ela e, com isso, vamos reduzindo o nosso círculo de relações. O outro vai tomando tanto nossa atenção que, aos poucos, até mesmo a família vai sendo esquecida.

Porém, quando esquecemos de cultivar estes vínculos que até então faziam parte de nós, vamos criando lacunas afetivas dentro do nosso coração. É nesse momento que a confusão acontece, pois todas as necessidades começam a ser preenchidas pela pessoa enamorada.

Com o passar do tempo, ela começa a carregar um fardo muito pesado, pois passou a exercer a função de pai, mãe, irmão e amigo, quando na verdade ela é apenas um namorado, ou namorada.

Cada forma de amor no seu lugar!

Essa relação começará ser muito pesada para ambos. Será fortemente marcada pela dependência, pelas cobranças e pelo ciúme. Ambos passam a viver uma insegurança muito grande, pois nunca sabem ao certo o papel que exercem na vida um do outro. O amor deixa de ser amor e passa a ser sentimento de posse, como se o outro fosse uma propriedade adquirida, pronta para atender todos nossos desejos.

Quando o coração humano identifica esse sentimento de posse, ele tende a se esconder de si mesmo e, conseqüentemente, dos outros. Teme que alguém venha quebrar o encanto, mostrando que não existe nenhuma história de amor e que ambos viraram sapos. E, o pior, acorrentados.

Mas a mudança é sempre possível. Só é preciso que sejamos honestos. Se por acaso você se identificou com esta possessiva e conturbada forma de amar, vale à pena buscar uma ajuda. Comece a canalizar melhor os seus afetos. Não os direcione a uma única pessoa. Tenha amigos, cultive-os. Redescubra sua casa, seus pais, seus irmãos, mesmo que existam problemas entre vocês.


Deixe aflorar os afetos que ficaram adormecidos dentro de você. Não coloque sobre a pessoa que você diz amar a responsabilidade de ser o centro do seu mundo, nem se sinta deixado de lado o dia em que ela disser que não vai lhe ver, porque precisa ficar com a família. É que existem momentos que o colo da mãe é muito mais necessário do que o seu.

É duro de ouvir isso? Pois é, muito mais duro é não compreender! "

Pe. Fábio de Melo

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O casal perfeito

"A solidão dos homens tem a medida da solidão de suas mulheres.

Isso eu disse e escrevi – e repito – em dezenas de palestras por este país afora. Aí me pedem para escrever sobre o casal perfeito: bom para quem gosta de desafios. O casal perfeito seria o que sabe aceitar a solidão inevitável do ser humano, sem se sentir isolado do parceiro – ou sem se isolar dele?
O casal perfeito seria o que entende, aceita, mas não se conforma, com o desgaste de qualquer convívio e qualquer união.
Talvez se possa começar por aí: não correr para o casamento, o namoro, o amante (não importa) imaginando que agora serão solucionados ou suavizados todos os problemas – a chatice da casa dos pais, as amigas ou amigos casando e tendo filhos, a mesmice do emprego, chegar sozinha às festas e sexo difícil e sem afeto.
Não cair nos braços do outro como quem cai na armadilha do ‘enfim nunca mais só!’, porque aí é que a coisa começa a ferver.
Conviver é enfrentar o pior dos inimigos, o insidioso, o silencioso, o sempre à espreita, o incansável: o tédio, o desencanto, esse inimigo de dois rostos.
Passada a primeira fase de paixão (desculpem, mas ela passa, o que não significa tédio nem fim de tesão), a gente começa a amar de outro jeito. Ou a amar melhor; ou, aí é que a gente começa a amar. A querer bem; a apreciar; a respeitar; a valorizar; a mimar; a sentir falta; a conceder espaço; a querer que o outro cresça e não fique grudado na gente.
O cotidiano baixa sobre qualquer relação e qualquer vida, com a poeira do desencanto e do cansaço, do tédio. A conta a pagar, a empregada que não veio o filho doente, a filha complicada, a mãe com Alzheimer, o pai deprimido ou simplesmente o emprego sem graça e o patrão de mau humor.
E a gente explode e quer matar e morrer, quando cai aquela última gota – pode ser uma trivialíssima gota – e nos damos conta: nada mais é como era no começo. Nada foi como eu esperava. Não sei se quero continuar assim, mas também não sei o que fazer.
Como a gente não desiste fácil, porque afinal somos guerreiros ou nem estaríamos mais aqui, e também porque há os filhos, os compromissos, a casa, a grana e até ainda o afeto, é preciso inventar um jeito de recomeçar, reconstruir.
Na verdade devia-se reconstruir todos os dias. Usar da criatividade numa relação. O problema é que, quando se fala em criatividade numa relação, a maioria pensa logo em inovações no sexo, mas transar é o resultado, não o meio.

Um amigo disse no aniversário de sua mulher uma das coisas mais belas que ouvi: ‘Todos os dias de nosso casamento (de uns 40 anos), eu te escolhi de novo como minha mulher’. Mas primeiro teríamos de nos escolher a nós mesmos diariamente. Ao menos de vez em quando sentar na cama ao acordar, pensar: como anda a minha vida? Quero continuar vivendo assim? Se não quero, o que posso fazer para melhorar? Quase sempre há coisas a melhorar, e quase sempre podem ser melhoradas. Ainda que seja algo bem simples; ainda que seja mais complicado, como realizar o velho sonho de estudar, de abrir uma loja, de fazer uma viagem, de mudar de profissão.
Nós nos permitimos muito pouco em matéria de felicidade, alegria, realização e sobre tudo abertura com o outro.
Velhos casais solitários ou jovens casais solitários dentro de casa são terrivelmente tristes e terrivelmente comuns.

É difícil? É difícil.
É duro? É duro.

Cada dia, levantar e escovar os dentes já é um ato heróico, dizia Hélio Pellegrino.
Viver é um heroísmo, viver bem um amor mais ainda.
O casal perfeito talvez seja aquele que não desiste de correr atrás do sonho de que, apesar dos pesares, a gente, a cada dia, se escolheria novamente, e amém."


Lya Luft

Amor é Síntese




"Por favor não me analise

Não fique procurando cada ponto fraco meu
Se ninguém resiste a uma análise profunda
Quanto mais eu
Ciumento, exigente, inseguro, carente
Todo cheio de marcas que a vida deixou
Vejo em cada grito de exigência
Um pedido de carência, um pedido de amor
Amor é síntese
É uma integração de dados
Não há que tirar nem pôr
Não me corte em fatias
Ninguém consegue abraçar um pedaço
Me envolva todo em seus braços
E eu serei perfeito amor."

Mário Quintana

Mulher de 30 ...


Cibele Santos

Frases soltas...



Clarice Lispector

Crônica de um casamento anunciado

"Fala-se muito que o casamento está em desuso. Tá nada. Podem as pessoas não estarem muito preocupadas em legalizar a união em cartório mas todos continuam querendo encontrar sua cara-metade. e morar em baixo do mesmo teto, bem agarradinhos. Porque isso estaria fora-de-moda? Casamento é ótimo, desde que não haja ciúmes, grude e gente de fora dando palpite. Em desuso estão aqueles casais que fazem a linha "só vou se você for", do contrário, casamento é diversão, companheirismo, intimidade, colo. Casem, crianças. Casem uma, duas, quantas vezes for necessário. Só não inventem de noivar.



Noivado, sim, não entra na minha cabeça. Em priscas eras, noivado significava promessa de casamento. O namorado podia passar do portão para o sofá da sala. O relacionamento ganhava um novo status, a mão direita uma aliança e abria-se um crediário para a compra dos móveis. A data era marcada para quando o rapaz se formasse, dali a três anos. Enquanto o grande dia não chegava, o pretendente começava a estagiar com o sogro e o casal de pombinhos saía aos domingos para comer uma pizza enquanto escolhia o nome dos sete filhos que viriam a ter. Adrenalina pura.


Para meu espanto, continua-se noivando adoidado, tudo em nome da tradição e dos bons costumes. E, creio eu, para materializar as grades que o namoro, por ser uma relação mais descompromissada, não tem. Um namoro pode acabar em casamento, pode acabar em amizade, pode acabar em pancadaria, mas pode acabar. Noivado, em princípio, não pode.


Noivado é um pré-casamento. Tem festa, padrinhos, presentes e anúncio no jornal. Não se sabe se eles noivaram porque estão se gostando mais ou vão começar a se gostar mais porque noivaram, mas acredito numa tese menos romântica: os noivados não passam de uma longa despedida de solteiro, onde tudo conduz à gandaia.


"Sou noiva." Diga essas palavras mágicas a um homem que goste de desafios e ele tentará desesperadamente levá-la a um motel barato. Noivas são tentadoras. Amigas íntimas do pecado. As musas de Nelson Rodrigues. Um Convite à cantada, já que não existe melhor termômetro para um homem medir sua sedução. Fazer uma mulher trocar de namorado é fácil, mas fazê-la desistir de um casamento, uau!


"Sou noivo." Diga essas palavras mágicas e a mulherada fugirá como o diabo da cruz. Nosso desafio é outro: pegar um homem desprevenido e conduzi-lo ao altar antes que ele caia em si. Encontrar um que esteja oferecendo o pescoço à forca por livre e espontânea vontade não faz parte dos nossos fetiches. É um homem rendido.


Noivado é fraude. Tentativa de ganhar tempo. Ok, vou dar uma chance ao cupido: também pode ser a prova de um sentimento arrebatador, único, ciente da própria eternidade. Só que não serve para nada nem garante coisa nenhuma. Tem gente que namora duas semanas, casa e comemora bodas de ouro. Outras ficam noivas dez anos e casadas apenas dez dias. Noivado é rito de passagem. Uma maria-fumaça. A paixão é o verdadeiro trem-bala."
 
Martha Medeiros, Julho de 1996

Apenas mais uma de amor

"Eu gosto tanto de você

Que até prefiro esconder
Deixo assim ficar subentendido
Como uma idéia que existe na cabeça
E não tem a menor obrigação de acontecer

Eu acho tão bonito isso de ser abstrato, baby
A beleza é mesmo tão fugaz

É uma idéia que existe na cabeça
E não tem a menor pretensão de acontecer...

Pode até parecer fraqueza
Pois que seja fraqueza entäo
A alegria que me dá


Isso vai sem eu dizer...


Se amanhã não for nada disso
Caberá só a mim esquecer (e eu vou sobreviver)
O que eu ganho o que eu perco
Ninguém precisa saber..."

Lulu Santos

O contrário do amor

"O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.


O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.


Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença, se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.


Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto."


Martha Medeiros, abril de 1999

domingo, 20 de dezembro de 2009

Mulher de 30 ...



Cibele Santos

Frases soltas...



Clarice Lispector

Admito que Perdi


"Passou. Parou de doer, de sufocar. Parou de roubar meus instantes. Parou de me invadir junto às tardes. Parou de me querer inteira quando eu só podia ser metade. Parou de exigir que eu fizesse alguma coisa. Parou de rir de mim. Parou de me perseguir. Parou de me jogar na cara o que eu não queria saber. Parou de me querer poeta quando eu só conseguia ser cronista. Parou de me alcançar no Leblon, em frente ao mar, ou na Paulista, na mesa de um bar . Parou de gravitar em minha órbita.

Assim como quem dorme acompanhado numa noite de inverno e acorda sozinho numa manhã de verão e nem percebe a mudança de estação, despertei.
Não foi preciso abrir a janela. Não foi preciso espreguiçar. Foi preciso, apenas, perdoar. Mais que isso! Foi preciso admitir que perdi.
E aquele perdão não era outra coisa senão perdão a mim mesma. No dia em que entendi isso e consegui alcançar com a ponta dos meus dedos e o som das minhas lágrimas a ilusão maior que me perseguia, passou. Sarei de uma vaidade que parecia incurável.
Mas como nunca soube dosar nada, fui envenenada pelo o antídoto que me curou - percebi que meu perdão me tornou soberana e caí nas garras da soberba e do orgulho de pertencer a mim mesma.
Curiosa a vida, não?
A vaidade que alimentava minha ilusão maior, hoje alimenta a maior de todas as ilusões: a de que pertenço a mim mesma e que mereço ser minha."

Mônica Montone

O momento novo


"Igualzinho ao que acontece com todas as pessoas, num trecho ou outro da estrada, eu já senti tanta dor que parecia que os golpes haviam me quebrado toda por dentro. Não sabia se era possível juntar os pedaços, por onde começar, nem se o cansaço me permitiria movimentos na direção de qualquer tentativa. Quando o susto é grande e dói assim, a gente precisa de algum tempo para recuperar o fôlego. Para voltar a caminhar sem contrair tanto os ombros e a vida. Um espaço para a gente quase se reinventar.


O tempo passa. O fôlego retorna. Parece milagre, mas as sementes de cura começam a florescer nos mesmos jardins onde parecia que nenhuma outra flor brotaria. A alma é sábia: enquanto achamos que só existe dor, ela trabalha, em silêncio, para tecer o momento novo. E ele chega."
 
Ana Jácomo

Eu quero acreditar



"Não precisa gostar de mim se não quiser. Mas não me faça acreditar que é amor, caso seja apenas derivado. Não me diga nada - ou me diga tudo. Não me olhe assim, você diz tanta coisa com um olhar. E olhar mente, eu sei! E eu sei porque aprendi. Eu não me contento com pouco - não mais. Eu tenho muito dentro de mim e não estou a fim de dar sem receber nada em troca."


Fernanda Melo

sábado, 19 de dezembro de 2009

Mulher de 30 ...



Cibele Santos

Frases soltas...



Caio Fernando de Abreu

A necessidade de desejar

"Todos sentem necessidade de amar, e esta necessidade geralmente é satisfeita quando encontramos o objeto de nosso amor e com ele mantemos uma relação freqüente e feliz.
Pois bem. Enquanto vamos juntinhos à feira escolher frutas e verduras, enquanto mandamos consertar a infiltração do banheiro e enquanto vemos televisão sentados lado a lado no sofá, o que fazemos com nossa necessidade de desejar?


Lendo Alain de Botton, um escritor inglês que já foi mencionado nesta coluna, deparei-me com essa questão: amor e desejo podem ser conciliáveis no início de uma relação, mas despedem-se ao longo do convívio. Só por um milagre você vai ouvir seu coração batendo acelerado ao ver seu marido chegando do trabalho, depois de vê-lo fazendo a mesma coisa há cinco, dez, quinze anos. Ao ouvir a voz dela no telefone, você também não sentirá nenhum friozinho na barriga, ainda mais se o que ela tem para dizer é “não chegue tarde hoje que vamos jantar na mamãe”. Você ama o seu namorado, você ama a sua mulher. Mais que isso: você os tem. Mas a gente só deseja aquilo que não tem.
O problema da infidelidade passa por aqui. Muitos acreditam que a pessoa que foi infiel não ama mais seu parceiro: não é verdade. Ama e tem atração física, inclusive, mas não consegue mais desejá-lo, porque já o tem. Fica então aquele vácuo, aquela lacuna, aquela maldita vontade de novamente desejar alguém e ser desejado, o que só é possível entre pessoas que ainda não se conquistaram.
Não é preciso arranjar um amante para resolver o problema. Há recursos outros: flertes virtuais, fantasias eróticas, paqueras inconseqüentes. Tem muita gente aí fora a fim de entrar nesse jogo sem se envolver, sem colocar em risco o amor conquistado, porque sabe que a troca não compensa. Amor é jóia rara, o resto é diversão. Mas uma diversão que precisa ter seu espaço, até para salvar o amor do cansaço.
Necessidade de amar x necessidade de desejar. Os conservadores temem reconhecer as diferenças entre uma e outra. Os galinhas agarram-se a essa justificativa. E os moderados tratam de administrar essa arapuca."

Martha Medeiros, fevereiro de 1999.

Sobre Verdades e Amor



"O amor nunca vem antes, não há oração, coração ou simpatia para que ele se anteceda. Vencer a nós mesmos, vencer a própria pressa, suportar e decifrar o descaso e descanso da hora. Esperar. Esperar como se não tivessemos urgência, esperar como se a espera fosse o último motivo de não ir para frente. O amor nunca vem antes. Nunca antes da paixão, nunca antes da primeira oportunidade para pular do barco, nunca antes de conhecer o outro tão fundo a ponto de desistir. O sentimento seleciona ou anula, e entre um sim ou um não a linha é tão tênue e ao mesmo tempo um enorme abismo. Sim ou não. Uma escolha rende a história de uma vida, ou de duas. Escolher quando a chance de ser escolhido é bem maior. O amor nunca vem antes... sempre virá depois do que pensamos ser amor."



Cáh Morandi

Perfeita Hoje

"O mundo me prefere com dois braços e duas pernas, mas não sei mais ser humana. Sorrir cansa. Chorar cansa. Mas o que mais cansa é procurar desesperadamente um intermediário e esquecer que o mundo é mais que aparências.




Eu sou volúvel. Grande surpresa. Mas ser volúvel também cansa. Porque ninguém leva a sério alguém que passa a semana chorando pra ficar bem na semana seguinte. Como se fosse preciso ser feliz pra sempre ou triste pra sempre pra ser alguma coisa de verdade.


Não quero mais a realidade comum. Isso é o que mais cansa, pra ser bem sincera. Tenho até arrepios de pensar num futuro escrito e óbvio nas prateleiras de gente sem sal. Só de saber o que vai ser de mim, já quero ser outra coisa. Uma coisa nova e diferente, pra quebrar o que é certo.


Eu ando tão cansada de seguir as regras. Ando tentando mudar as regras. Eu sei que o que acomoda não é fácil de mudar, mas alguém um dia tem que dizer chega, né? Pras coisas mudarem, o mundo girar. Tanta engrenagem e tão pouco suor.


Só sei que ando dedicando meus dias pra gente que nem sabe que eu existo. Vou fazer minha faculdade, conseguir meu diploma. Vou fazer o que for preciso pra nunca mais precisar fazer nada. E passar o resto da minha vida fingindo que acredito na minha liberdade. "
 
Verônica H

De repente você cansa

"De repente você cansa.

Cansa das músicas que sempre ouviu, das pessoas que te cercam, das roupas no armário, das ruas em que anda.
Cansa do jeito que penteia o cabelo, do jeito que levanta da cama todos os dias e das palavras que escolhe para não dizer o que realmente gostaria de dizer.
Cansa de procurar beleza onde beleza não há e até mesmo de desculpar.
Cansa de tentar fazer os outros enxergarem que seus pesadelos são apenas uma ponte rumo ao nada e não uma encruzilhada.
Cansa de ofertar o verão que queima nos olhos e de ostentar indiferença e cansa, sobretudo, de tentar fazer a diferença.
Cansa de tentar fazer o certo o tempo todo e de se perdoar quando faz o errado.
Cansa pelo drama do amigo distante, cansa pelas lamentações do amigo ao lado.

E por mais que você corte o cabelo, compre roupas novas, faça uma viagem, leia sobre assuntos inimagináveis, transe debaixo de uma ponte, faça uma tatuagem, coloque um piercing, delete amigos do seu Facebook, Twitter, Orkut e do seu convívio social, esse cansaço não passa.
Porque no fundo você não está cansado do mundo, mas da maneira como reage a ele.
Da maneira como reage a uma pedrada, a uma flor, a um menino de rua, a ausência da lua em suas noites cheias.
Não é difícil aceitar as pessoas como elas são, difícil é mudar a maneira como reagimos a elas.
Não é aceitar a vida como ela é que cansa, mas sim a dança que fazemos para nos esquivar de tudo aquilo que não entendemos ou sentimos medo.
Sei não, mas talvez o poeta tenha razão quando diz que ‘o que cansa, mesmo, é a insegurança’...
Porque só repete o mesmo padrão de comportamento/emoção, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, quem precisa da pseudo-segurança que ‘o habitual’ carrega no ventre.
Ultimamente tenho optado pela mudança. Não a mudança que alcança os olhos, como um corte de cabelo, mas a mudança que me faz dormir contente por ter agido diferente.
Ela cansa tanto quanto, mas pelo menos me faz sentir que estou viva e não apenas vivendo os dias."


Monica Montone

Desejo




"Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.

Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.

E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.

Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.

Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra ,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.

Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.

Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga `Isso é meu`,
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.

Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.

Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar."

Victor Hugo

A sabedoria do não saber



"O conhecimento emprestado,

é ignorância.
A verdade experienciada não o
torna instruído, mas humilde.
Quanto mais você conhece,
menos alega conhecer.
No dia que conhecê-la perfeitamente,
você somente pode dizer:
"Eu estou em absoluta ignorância; e sou
simplesmente uma criança colecionando
pedrinhas conchinhas à beira-mar.
Eu não sei nada".
"Eu não sei" pode somente ser dito
por uma pessoa que sabe
perfeitamente.
As pessoas que dizem "Nós sabemos"
são pessoas absolutamente ignorantes,
suas memórias estão repletas.
Mas estas memórias são mortas, porque
elas não deram à luz nenhuma
experiência própria."

Osho

Um pedido



"Eu não quero que você seja eu.

Eu já tenho a mim.
O que quero é que você chegue com
seu poder de chegar e de me
devolver pra mim.

Que você chegue com seu dom de também
me fazer chegar perto de mim.
Para me fazer ver o que sou
e que só você viu.

Para eu ser capaz de amar também
o que só você amou.

Eu não quero que você seja
igual a mim.
Eu já tenho a mim.

Não quero construir uma casa de espelhos
que multiplique minha imagem
por todos os cantos.

Quero apenas que você me reflita
melhor do que julgo ser".


Pe Fábio de Melo

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Mulher de 30 ...



Cibele Santos

Estão juntos? Mas eles viviam brigando

"O amor é a reviravolta dentro da diferença.

É fácil descobrir quem pode se apaixonar. Basta que os dois, que mal se conhecem, estejam brigando.
Ambos largam a conversa do grande grupo para os braços discordarem com maior liberdade. Entram em transe no meio da mesa. Já discutem com ardor, teimam por detalhes, acalentam seminários paralelos e sem fim. A princípio, identifica-se uma dissidência atroz, uma dessemelhança furiosa. Pelo primeiro encontro, a projeção é que nunca serão amigos. Demonstram um ódio mútuo pelas opiniões emitidas. Falta apenas sair no tapa.
Essas figuras antagônicas têm grandes chances de se casarem a partir daquele momento. Atraídas por tudo o que não entendem um no outro.

São como o mar: violentos na margem, com repuxo e pancadas ininterruptas das ondas, e tranqüilos após ultrapassar a linha da arrebentação.
Desencadeamos uma relação não pela simpatia superficial, pela vizinhança óbvia das idéias, pelas afinidades visíveis, mas pelo desconhecido. É o desconhecido que nos chama. Algo que ele disse e não se concorda, mas é intrigante - estimula a desejar entender. Algo que ela disse e é poético, até incompreensível - reivindica um quarto escuro e uma música para pensar melhor.
O desconhecido irrita no começo, pede espaço, tempo e intimidade. Provoca o espanto e o cansaço intelectual. Temos que caminhar mais rápido para alcançar. Passar pela nossa moralidade de madrugada na ponta dos pés, sem acordá-la.
Não nos apaixonamos por aquilo que sabíamos, mas por aquilo que não sabemos e descobrimos que precisamos. Descobrimos subitamente que não podemos mais viver sem. As declarações "ele é insuportável"/"ela é insuportável" devem ser traduzidas imediatamente em "ele me envolve"/"ela me envolve".
O par se defenderá nos primeiros contatos, numa queda-de-braço silenciosa e inflexível. Há um exagero proposital na armadura, no combate. Nenhum dos dois aceitará uma trégua. Nenhum dos dois aceitará recuar e se desculpar. Nenhum dos dois admitirá a derrota dos argumentos. Mostram que são mais decididos, mais temperamentais, mais convictos. E não largam sua posição intolerante porque estão se exibindo, estão alertando que são bons. Quase a comentar: "vê como sou forte, não é isso que está procurando?"
Tentam convencer, e, de modo involuntário, seduzem. A oposição é enganosa: a provocação é uma cilada: a contrariedade é um pretexto para não encerrar a conversa.
Não se ama sem incomodar e ser incomodado antes. Os cachorros de casa vão latir desesperadamente pelo avanço do estranho pelos nossos corredores.
Por que ele me perturba tanto? Por que ela me perturba tanto?
Ela não entende sozinha, e ele não entende sozinho, e voltam a se encontrar para procurar a resposta.
O amor cria sua dependência pela raiva. Porém, não é raiva, parece raiva; é mistério."


Fabrício Carpinejar

O Medo de Perder

"Tenho certeza que não te amo. Amo quem eu quero que você seja. Me apaixonei por quem eu quero que você se transforme, mas eu sei que não amo você.

Mas então, porque tanto medo de te perder?
E não é perder pra outra. Porque é como se eu soubesse que no fundo você é meu, mesmo se estiver com outra em teus braços. Eu tive medo de te perder, de perder tua vida.
Queria entender porque meu subconsciente ligou o medo de perder alguém amado a você, porque ele ligou o sentimento de tudo perdido a você, a falta a você, o desespero a você.

Aquele pesadelo me deixou bamba das pernas. Me deixou medrosa e desesperada. A possibilidade de nunca mais te ver doeu no peito. E só de pensar que, a qualquer momento, você pode ir embora de mim, do mundo... Eu fecho os olhos e respiro fundo. Boto tudo a perder. Deixo claro pra você que eu tenho medo, medo de nunca poder te dizer que eu acredito em você. Medo de que a gente nunca mais recupere aquele abraço que eu achava tão gostoso e com o tempo foi perdendo o sabor. Medo de nunca poder dormir de conchinha contigo e esquecer do mundo lá fora. Medo de nunca conseguir te dizer que, eu nem sei porque, mas eu penso em você todos os dias e sinto que você é especial pra mim, de alguma forma.
Quando me vi diante do susto. O susto de nunca mais poder sentir raiva de você porque você nunca mais ia poder me falar todas aquelas bobagens que me tiram do sério. O susto de nunca mais poder sentir nojo de você, porque você nunca mais ia ter uma nova namoradinha que fosse tão igual a todas as outras. O susto de não poder te olhar nos olhos e saber que você ta lendo tudo que eu sinto.
Eu tive tanto medo de te perder que nem me importei de colocar toda aquela crosta dura e impenetrável que eu criei entre a gente a perder. Nem me importei de te falar que é agoniante e desesperador saber que você não existe mais.
Eu prometo! Prometo que hoje, quando colocar minha cabeça no travesseiro eu vou orar. Vou orar por você. Pra que Deus te proteja em qualquer situação. Vai ser um fardo muito duro de carregar se eu nunca mais puder rir contigo e me encontrar no teu coração. Vai ser duro saber que ‘nunca mais’, mesmo que seja esse meu inútil desejo.

E eu, sinceramente, nem sei porque tudo isso. Eu, que não amo você e morro de medo de te perder."

Natália Carneiro

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Viagens





"A viagem não acaba nunca.

Só os viajantes acabam.

E mesmo estes podem prolongar-se
em memória, em lembrança,
em narrativa.

Quando o visitante sentou na areia da praia e disse:
"Não há mais o que ver", saiba que não era assim.
O fim de uma viagem é apenas o começo de outra.

É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez
o que já se viu, ver na primavera o que se
vira no verão, ver de dia o que se viu de
noite, com o sol onde primeiramente
a chuva caía, ver a seara verde, o
fruto maduro, a pedra que
mudou de lugar, a sombra
que aqui não estava.


É preciso voltar aos passos que foram
dados, para repetir e para traçar
caminhos novos ao lado deles.

É preciso recomeçar a viagem...SEMPRE!"

José Saramago