Não nasci para isso, definitivamente. Essa coisa que quase é, esse “pode ser” que muda para “nem pensar” a cada troca de cômodo. Eu só queria ter a certeza de estar me maquiando para você, a certeza de estar misturando toalhas e sucrilhos por conta de uma surpresa da vida e não de uma luta contra o tédio. Eu só queria encontrar alguém que não repassasse a porra da agenda do celular na minha frente.
Puxa, como foi bacana ele ter telefonado no dia seguinte. Claro, muito bacana. Como foi bacana a gente ter dormido de conchinha e ele ter me pedido um pouco de bolacha água e sal no meio da madrugada. Adorei que ele me ligou no dia seguinte, para me dar aquele bom dia de amigos. Muito bacana mesmo. Claro que não temos nada e nem nunca teremos. A não ser aquele ataque de riso maravilhoso que ele dá quando eu me atrapalho pra tomar sorvete e fico parecendo uma desdentada. Tenho esse tesão por ele, esse tesão pela maneira tímida e desleixada com a qual ele amarra a toalha branquinha na cintura. E me olha do tipo “ei, velha amiga, não acha que mereço um pouco de carinho?”. Mas que bom que ele ligou no dia seguinte para dar aquele bom dia de amigo. Que bom. Quem disse que mulher é tudo louca e se você ligar no dia seguinte para dar bom dia ela vai achar que está namorando? Quem disse? Heim? Hum? Quem disse? Achei mesmo bacana essa atitude super moderna de um homem macho super moderno me tratando como uma fêmea ultra moderna e tudo mais. Mas não nasci pra isso, definitivamente. Como assim ele me liga no dia seguinte pra me dar bom dia e depois simplesmente desaparece no mundo? Como assim? Eu não nasci pra isso não.Saio do banho sem pensar em nada disso e encho minha cara de cremes. Creme de boca para ressecamento, creme de testa para oleosidade e creme de olhos para rugas. Durmo feia, sozinha e tranquila. Sem pensar em sofás, sucrilhos, toalhas, bom dia de amigos e vidas planejadas. Ainda assim, continuo achando que não nasci pra isso, definitivamente."
Tati Bernardi
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