"(...) Comecei a ficar mais atenta às verdadeiras razões dos meus choros, que, aliás, costumam ser raros.
_Já aconteceu de eu quase chorar por ter tropeçado na rua, por uma coisa à-toa.
_É que, dependendo da dor que você traz dentro, dá mesmo vontade de aproveitar a ocasião para sentar no fio da calçada e chorar como se tivéssemos sofrido uma fratura exposta.
_Qualquer coisa pode servir de motivo.
_Chorar porque fomos multados, porque a empregada não veio, porque o zíper arrebentou bem na hora de sairmos pra festa.
_Que festa, cara-pálida?
_Por dentro, estamos em pleno velório de nós mesmos, chorando nossa miséria existencial, isso sim.
_Não pretendo soar melodramática, mas é que tem dias em que a gente inventa de se investigar, de lembrar dos sonhos da adolescência, de questionar nossas escolhas, e descobre que muita coisa deu certo, e outras não.
_Resolve pesar na balança o que foi privilegiado e o que foi descartado, e sente saudades do que descartou.
_Normal, normalíssimo. São aqueles momentos em que estamos nublados, um pouco mais sensíveis do que gostaríamos, constatando a passagem do tempo.
_Então a gente se pergunta: o que é que estou fazendo da minha vida?
_Vá que tudo isso passe pela sua cabeça enquanto você está trabalhando no computador.
_De repente, a conexão cai, e em vez de desabafar com um simples palavrão, você faz o quê?
_Cai no berreiro. Evidente.
_Eu sorrio muito mais do que choro, razões não me faltam para ser alegre, mas chorar faz bem, dizem.
_Eu não gosto. Meu rosto fica inchado e o alívio prometido não vem. Em público, então, sinto a maior vergonha, é como se estivesse sendo pega em flagrante delito.
_O delito de estar emocionada. Mas emocionar-se não é uma felicidade?
_Neste admirável mundo de contradições em que a gente vive, podemos até não gostar de chorar, mas trata-se apenas da nossa humanidade se manifestando: a conexão do computador, às vezes, cai; por outro lado, a conexão conosco mesmo, às vezes, se dá.
_Sendo assim, sou obrigada a reconhecer: chorar faz bem, não importa o álibi.
_É sempre a dor do crescimento. "
Tati Bernardi
0 comentários:
Postar um comentário