"Finalmente, aconteceu o melhor: eu entreguei os pontos. Tem hora em que deixar-se vencer pelo cansaço é que é vitória. Não para ficarmos morando nele, pois quando cansaço passa a parecer casa já virou cilada. Deixar-se vencer pelo cansaço, às vezes, só para a coragem descansar um pouco, tomar ar, beber uma água, estirar as pernas. Outras, para desistirmos de tentar ignorar o pedido de escuta do nosso coração, que está cheio de coisas pra nos dizer, meio doído, meio assustado, meio aperreado, carente do olhar da gente. Querendo tempo. Querendo colo. Querendo abraço com os braços bons da ternura.
Por preguiça afetiva, pra não darmos confiança para alguns sentimentos, pra economizarmos lágrima, por medo de que desminta as mentiras que nos contamos por comodismo, a verdade é que muitas vezes desconversamos quando o nosso coração tenta puxar assunto. E, não é raro, desconversamos com a maior cara-de-pau do mundo. Desconversamos com os recursos mais costumeiros, com outros inéditos, alguns até bizarros. Para esse tipo de escuta, quando é a nossa vida que está na berlinda e não a alheia, bem mais do que coragem, há que se ter também muito amor.
Então, finalmente, aconteceu o melhor: eu entreguei os pontos. Cansei de resistir ao papo. Procurei um lugar confortável em mim, diminuí o volume dos ruídos todos do lado de fora, pausei os afazeres, sem mais nenhuma resistência e com toda honestidade amorosa de que era capaz. Disse pra ele:“Fala, meu amado, eu estou aqui inteirinha com você.”
E ele falou tudo o que sentia e tudo o que sentia era legítimo. Choramos juntos sem economia de instante, depois assoamos a vida. Desapertou. Desapertamos. Respiramos mais macio. Criamos espaço, os dois. Combinamos deixar coisas pra trás e seguir em frente, mais leves. Combinamos que nem sabíamos direito como era isso de seguir em frente, mas que ali onde estávamos também não havia mais jeito de retorno. Combinamos que descobriríamos, juntos, ao caminhar.
Ana Jácomo
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