domingo, 28 de março de 2010

Traduzir-se

"Uma parte de mim é todo mundo:

outra parte é ninguém: fundo sem fundo.


Uma parte de mim é multidão:
outra parte estranheza e solidão.

Uma parte de mim pesa, pondera:
outra parte delira.


Uma parte de mim almoça e janta:
outra parte se espanta.


Uma parte de mim é permanente:
outra parte se sabe de repente.


Uma parte de mim é só vertigem:
outra parte, linguagem.

Traduzir uma parte na outra parte
— que é uma questão de vida ou morte
—será arte?"

Ferreira Gullar

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