quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Sozinha

"Morar sozinha é um eterno exercício de conviver com a falta das coisas. Falta comida na geladeira, falta Veja Multiuso, falta Perfex e falta gelo no congelador. Faltam coisas que a gente, simplesmente, esquece de comprar. Só que, tem dias, como as tardes de domingo, que faltam muito mais coisas do que essas que a gente simplesmente esquece de comprar. Falta a conversa com a melhor amiga de infância que não está aqui mais, falta o colo da mãe, falta o pai instalando fios pela casa e consertando o DVD, falta a briga com o irmão mais novo, falta o conselho do irmão mais velho, falta o assovio estridente do Coração na varanda, falta a Quita e o Coração brigando e se bicando depois, falta o carinho do namorado (!!!), falta aquele filme tosco com edredom no sofá da sala.
Quem mora sozinha, às vezes, se sente a pessoa mais triste do mundo. Mas não é tristeza. É só saudade. Como já disse Martha Medeiros, “saudade é (...) não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche” e eu digo mais. É não saber o que fazer com as tardes de domingo que nunca terminam. As tardes de domingo, quando cada um está na sua casa, com sua família, com seu namorado e, você está na sua casa, com sua TV e seu DVD (pirata) da Grande Família.
Morar sozinha é nunca ter almoço em casa. Ninguém cozinha pra uma pessoa só. Guardar o resto da comida? Nem pensar. Duraria uma eternidade na geladeira. Quem mora sozinha não pode ter nunca a geladeira cheia. Tudo estraga. Experiente comprar um queijo Minas, por exemplo. E a penca de bananas? De cada doze, você come duas e o resto joga fora. Preta.
Morar sozinha é almoçar sábado e domingo no self-service. É ligar, às duas da tarde, para a amiga que está almoçando com os pais no Porcão, e para uma outra, que está com o namorado na pizzaria da esquina da sua casa. E você, comendo arroz integral no self-service. É ter que fazer supermercado no sábado à noite e dar aquela “ajeitada” na casa que está de cabeça pra baixo e você não faz a mínima idéia de quem bagunçou aquilo tudo! É levar a roupa pra lavanderia segunda-feira meia noite.
É voltar pra casa sozinha, chorando, depois de terem roubado o som do seu carro às duas da manhã num bairro que fica a quase meia hora da sua casa. Chorar sentada na beirada da cama, deitar e dormir. É acordar todo dia e ficar feliz porque seu passarinho faz festa pra você, porque ele vem correndo quando você chega do trabalho e quer ficar do seu lado.
Viver sozinha é aprender a dar valor às coisas simples da vida: o cheiro de quem a gente gosta, a conversa jogada fora, a crise de riso (por um motivo que nenhuma outra pessoa no mundo acharia graça), o abraço de quem não volta mais, a tarde na beira da piscina, os pés embolados debaixo do edredom, o socorro à 1h30 da manhã de terça-feira quando você não tinha forças nem pra se levantar. Morar sozinha é aprender a conviver com sua própria companhia e ter que gostar dela. Mesmo quando ela está triste nas tardes de domingo. "

Brena Braz

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