"Há poucas semanas, a última página da revista Veja deu espao para o ponto de vista de uma leitora que estava com o atual marido preso, acusado de não pagar pensão para a primeira mulher. A televisão também andou mostrando imagens de um prisioneiro cumprindo pena pelo mesmo motivo. Assunto delicado, esse. Envolve dinheiro e cobrança, as mais diversas. Mas é uma discussão que, inevitavelmente, vai entrar na ordem do dia. As mulheres conquistaram uma série de direitos e talvez tenha chegado a hora de pagar por eles.
Nos últimos 30 anos, a independência da mulher deixou de ser uma hipótese para ser um fato, e tudo o que aprendemos sobre relacionamento homens e mulheres, até segunda ordem, está cancelado. Estamos reaprendendo a conviver segundo as novas regras do jogo. Mudou tudo: sexo, amor, casamento, separação, fidelidade, educação dos filhos, orçamento doméstico, hierarquia familiar. Para quem está ficando adulto agora, as regras são claras: não se fazem mais moças como antigamente. Hoje toda adolescente estuda ou trabalha, investindo no seu próprio pé-de-meia e contando consigo mesmo para seus projetos futuros. Em resumo: está descolando um emprego antes de descolar um marido.
Mas faz pouco tempo que o mundo é assum. Quem está comemorando bodas de prata ainda pegou uma época em que, se a mulher trabalhava, era moderna, e se não trabalhava, era normal. Tudo bem ficar em casa cuidando da educação das crianças e da administração da casa. Era, e ainda é, uma atividade essencial e valiosa, mas não é profissão.
Ninguém é remunerado por buscar os filhos no colégio ou fazer o almoço. Ninguém declara imposto de renda por cerzir meias ou arrumar armários. As mulheres topavam a dependência total, do pai para o marido. E os maridos topavam a adoção, sem contestar. Não conheço nenhum caso de um homem, 30 anos atrás, chegar para mulher e dizer: 'Amor, deixa essa musse de limão para lá e vai procurar um emprego. E não se preocupe: eu lavo a roupa pra você'. Nada disso. Estava bom para ambas as partes, e hoje, separadinhos da silva, pagam caro por ter nascido na pré-história. Eles perdem 1/3 do salário, elas ganham 1/3 de humilhação. Uma pena, mas lei é lei.
Encerradas as cenas de um casamento medieval, entramos na er do casamento liberal. Oba! Todos saem cedo, ele para um lado, ela para o outro, filhos na creche desde os 4 meses, casa um preservando sua individualidade, seu emprego e sua graninha. Bem diferente da vovó e do vovô. Mas as separações continuam a todo vapor e o legislativo vai ter que decidir: nossas filhs também serão sustentadas pelo ex?
Pouco provável. Já se conheceram independentes, pois despeçam-se com um aperto de mão civilizado e desapareçam da vida um do outro, resolvendo juntos apenas as questões relacionadas com os filhos. Pensão alimentícia, só para as crianças. Se ela tem uma formação profissional e tem saúde, é hipocrisia querer herdar o paternalismo que tanto se lutou para romper. É dureza? É, amiga, mas querer só o bem-bom não é justo com os cavalheiros. Ser dona do próprio nariz não sai barato.
Esta questão tende a ser enfrentada com menos pancadaria nos próximos anos, mas por enquanto ainda tem casal saindo no braço. Só agora estamos começando a aceitar a idéia de que um casamento, para dar certo, não precisa durar até que a morte os separe. Dez, 15 anos de felicidade conjugal podem ser bem satisfatórios, e se não der mais para ficar junto, paciência, até mais.
Nada romântico, mas bem realista. Reconhecendo a possibilidade de uma separação futura, ainda que não esteja nos planos de nenhum dos dois, é possível estruturar-se financeiramente para não ter que um dia lavar roupa suja num tribunal. É triste admitir que o amor não dura para sempre, mas tornou-se imperativo aceitr que o dinheiro dele também não."
Martha Medeiros, Junho de 1995
domingo, 17 de janeiro de 2010
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