sábado, 21 de novembro de 2009

Nós, mulheres

"Se todas nós fôssemos belas, simpáticas e atraentes; se fôssemos ótimas amantes e profissionais bem sucedidas; se cuidássemos dos filhos, da casa, da empregada e fizéssemos parte de algum voluntariado... puxa vida, seríamos fantásticas!
Pois é, mas não estamos com toda essa bolinha apesar de sermos bombardeadas por uma mídia que apela para sermos a “Mulher-Maravilha”, custe o que custar. E não tendo muita estrutura para agüentarmos tal imposição, saímos desatinadas à procura da academia mais próxima ou de uma clínica que nos ofereça “o pacote milagroso”, ou seja, a promessa de virarmos um mulherão, pelo menos em termos de beleza.
Malhamos como loucas, e, muitas vezes, saímos da academia com a sensação de termos virado uma Barbie. Já estamos com a cabeça feita: mulher tem de ser magra, esquelética, quase anoréxica. Está tudo à nossa disposição: desde aulinhas cafonas, ensinando como sermos mais sensuais, até um festival de implantes de silicone.
Sensualidade não se aprende, é algo espontâneo. Cada mulher tem a sua peculiaridade; se não agradar aos gregos, agradará aos troianos...
O cuidado com nosso corpo é necessário, mas parece que perdemos o sentido exato das coisas. Estamos parecidas com robôs: cabelos iguais, lisos e repartidos; barrigas à mostra de todos os tamanhos e formas; muito silicone alterando medidas equilibradas ou muitas vezes nos impedindo de sorrir, travando nossa expressão facial.
Enfim, estamos uniformizadas; parece-me que fazemos parte de uma única escola, tudo cai bem para todas: o que veste a magra, a gorducha abocanha. E mais: temos ainda como opção, a lipoescultura. Essa técnica nos dá, de imediato, o contorno corporal adequado. Fantástico! Mas nada contra a lipoescultura: falo do exagero. E falo daqueles peitinhos horrorosos - que não são seios - de 400ml de silicone carregando frágeis criaturas parecendo embuchadas.
Mas depois de estarmos belas e formosas, de termos comido o pão que o diabo amassou, saímos a desfilar em companhia do nosso barrigudo, careca e gordo. Mas sendo homem, tá feito o embrulho; ma-ra-vi-lha! E não tem jeito: haverá sempre um atenuante para esses lindos gorduchinhos, pois mulher quando gosta, mascara. É uma atitude singular. Somos diferenciadas: trazemos à nossa vida amorosa, aquela coisa de mãe, gostamos apesar de feios, gordos e barrigudos. Por isso é que muitos estão tão à vontade...
Porém o contrário raramente ocorre: “A gorda tem namorado? Bá... o cara tá doente!”.
Mas falando sério, e apesar dessas firulas, podemos nos orgulhar diante da luta pela nossa emancipação.
A nossa verdadeira história é marcada a ferro e fogo à procura de um espaço nobre, seja nas artes, na literatura ou em outras áreas. Somos um Exército avançando e tomando posse do que nos é devido. Nada mais justo. E não seremos “desaforadas” por pretendermos chegar a um cargo maior...
Bom seria se fôssemos reconhecidas pelo que escrevemos ou falamos e não por termos lábios carnudos, peitos enormes e bumbum empinado.
Bom seria se fôssemos reconhecidas como profissionais capacitadas nas áreas técnicas com o mesmo reconhecimento e remuneração dispensada aos homens.
Bom seria se, após uma vida de trabalho, não sentíssemos o desconforto por estarmos aposentadas e o vazio de uma vida vista como improdutiva.
Bom seria se fosse reconhecido o nosso espírito de abnegação.Bom seria se, na velhice, fôssemos cercadas de atenções, de paciência e de amor.
Bom seria, se tivéssemos o reconhecimento dos filhos, como mães amorosas que tentaram acertar...
Mas ótimo seria se, na condição de mulher, não precisássemos matar um leão por dia para provar do que somos capazes."


Tais Luso de Carvalho

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